Crônica: De aranhas estou farto

Leitor fantástico que sou – não por ser um maravilhoso leitor, mas por ler coisas maravilhosas – e isso não quer dizer “maravilha” de excelente, mas de algo fora do comum – e até que aceito esse “fora do comum” como algo incomum à experiência do leitor brasileiro, que pouco tempo tem para tanto que há pra ler – o que deveria implicar que “leitor de fantástico” é uma expressão bem melhor pra começar um parágrafo e ganhar a simpatia do leitor, que acredito ser um sujeito fantástico, com as devidas flexões de gênero -, acabei cruzando o olhar recentemente com uma obra curiosa: A aranha negra, de Jeremias Gotthelf.

O livro de Gotthelf é um romance de terror que se passa numa aldeia suíça cristã. Baseada nas lendas sobre a famosa Peste Negra – aparentemente a explicação sobre a peste bubônica não tinha chegado a Gotthelf ainda -, trata de um acordo que o Diabo faz com uma aldeia para ajudar a cumprir uma tarefa ordenada por um senhor feudal tirano. Quando a aldeia não cumpre o combinado, um de seus moradores – uma mulher, porque misoginia não tem idade histórica – se transforma numa aranha que vai matando todo mundo. É uma leitura bem leve para os anaracnofóbicos.

Agora, se você é aracnofóbico como eu, se prepare: seus gatos – como agora me apareceu -, moscas – que espantei com Air Freshmatic, deixando o ambiente mais cheiroso e comprometendo ainda mais minha rinite -, lagartixas, etc. se tornam potenciais ameaças que remetem à aranha. Se livros podem mesmo mudar o mundo, este me transformou num paranoico.

Permanecia eu em minhas leituras quando a hora de me banhar aproximou-se célere. Fui ao chuveiro, deixei o livro de lado e com que me deparo? Uma aranha preta menor que minha unha à espreita no reboco. Não era venenosa, era doméstica - o que na verdade não impede nada, pois o mundo é o lar de todo animal e inseto, somos só locatários – e então pensei, “pois sim que ela me deixa enervado! Quer saber? Vou dar um jeito nisso.” Peguei o livro em cima da pia e saí do banheiro. Ela que reine por lá.

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